Por que Santo Agostinho ficou conhecido também por grande filósofo e influenciador da Idade Média?

A Filosofia Medieval corresponde à Idade Média, período que se estende do século V, com a tomada do Império Romano pelos hérulos, até o século XV, com a queda de Constantinopla na sua conquista pelos turcos-otomanos.

Por vezes, a Idade Média é descrita como um período de “trevas”, uma mera fase intermediária entre a idade antiga e a idade moderna na qual não houve relevante produção intelectual, até que chegasse o Iluminismo, ou o “Século das Luzes”.

Esta ideia tem origem no próprio Iluminismo e não retrata com fidelidade aquele período: é claro que as sociedades daquela época também buscavam saberes, estudos e conhecimento. É inerente ao ser humano a curiosidade pelas coisas que não se conhecem e a vontade de saber mais.

[...] viu-se que os últimos tempos da Idade Média estavam longe de ser a “Idade das Trevas”, que a vida intelectual esses séculos foi abundante e intensa e que as atividades educativas foram grandes. (MONROE, 1985: 139)

Durante a Idade Média, surgiram as primeiras universidades, formas de associações de professores e alunos que promoviam debates e discussões, unindo-se também para questionar os pensamentos e ideologias padrão da época.

Sempre houve uma tradição religiosa na filosofia ocidental, seja judaica, católica ou protestante, e não apenas na Idade Média. Contudo, é nesta época que se deu o link mais forte entre os âmbitos religioso, intelectual, artístico, político, econômico e social.

Tratavam-se todas essas áreas de um único elo, de uma única linha de pensamento, a qual tinha suas variáveis mas se limitava por si só. Talvez por isso tenha se considerado por tanto tempo a idade média a idade das trevas: seus conhecimentos difundidos estavam mais amarrados a dogmas.

Apesar disso, certamente existiam também debates e divisões de pensamento dentro das próprias concepções dogmáticas cristãs, à exemplo do tomismo (escola derivada de São Tomás de Aquino) e da resposta franciscana (escola derivada de São Francisco), correntes de pensamento um tanto controversas para a época.

Santo Agostinho (354-430) foi um teólogo e filósofo do direito canônico.

Para Agostinho, para se definir o que é direito, antes, é necessário definir o que é justiça.

Dessa maneira, sem a justiça não existe o direito e, tampouco, o Estado.

Segundo ele, ainda, o direito existe em função da religião. A justiça seria a lei de Deus, e a verdadeira justiça só poderia ser encontrada na Cidade de Deus. O direito natural, por conseguinte, vinha primeiramente da lei divina.

Agostinho foi fortemente influenciado pela teoria dualista de Platão, que fazia uma divisão entre o mundo das ideias e o mundo dos sentidos. Ele transformou a teoria platônica, de forma a adaptá-la à religião: o mundo ideal seria o mundo de Deus (Cidade de Deus), enquanto o mundo das coisas seria o dos seres humanos. Embora não fosse possível, na sua visão, encontrar a verdadeira justiça na vida terrena, as leis do Estado deveriam ser obedecidas por serem o reflexo das leis divinas que os homens conseguiram formular. Era adepto da união da fé e da razão, pois somente o conjunto das duas serias capaz de guiar o ser humano à verdade absoluta.

A verdadeira justiça, em suma, só poderia ser encontrada na Cidade de Deus e na lei eterna.

São Tomás de Aquino

São Tomás de Aquino (1225-1274) também foi um teólogo e filósofo do direito canônico.

Naquele período, houve a redescoberta da doutrina aristotélica e do Corpus iuris civilis, compilação de lei e jurisprudência criada por ordem do imperador romano Justiniano I (482-565).

São Tomás de Aquino procurou conciliar o pensamento greco-romano redescoberto com a tradição cristã.

Também estudioso do pensamento de Santo Agostinho, Tomás de Aquino acreditava que o direito pode ser descoberto e criado precipuamente pela razão (o que foi inovador na época, na qual se acreditava que as leis vinham, antes, da revelação divina).

Ele foi influenciado pelas ideias de Aristóteles no que diz respeito ao direito natural.

Tomás de Aquino acreditava que havia uma ordem natural, que era divina, e dava origem a lex aeterna, ou leis da natureza. Ele acreditava que as leis seguiam a seguinte ordem de classificação:

  1. Lei eterna ou divina;
  2. Lei natural, aquela que ordena os acontecimentos;
  3. Lei humana ou positivada, que deriva das leis precedentes.
  4. Para Tomás de Aquino, se a lei humana que estiver em contradição com as leis divinas e naturais, estará corrompida.

Além disso, o ser humano está sujeito à lex aeterna, mas pode escolher seus atos e construir seu pensamento utilizando-se de seu livre arbítrio. Assim, ele reconheceu o poder de decisão do ser humano que, dotado de razão, perseguirá seus interesses de acordo com suas próprias convicções.

Neste pensamento, está a origem da ideia de liberdades individuais.

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Principal filósofo do período da filosofia conhecido como Patrística, Agostinho de Hipona ou Santo Agostinho foi um filósofo da idade média cujo trabalho ajudou a fundar as bases da filosofia adotada pela Igreja Católica, bem como levantar questões que influenciaram a toda a história posterior da filosofia. Surge como um reformulador da filosofia patrística, praticada nos primeiros séculos do cristianismo, explorando temas que estavam além das questões do platonismo cristão, corrente filosófica mais popular nos primeiros anos da Patrística. Até Agostinho os filósofos cristãos defendiam que o fundamento e a essência da vida deveriam ser a fé, particularmente, a fé cristã. A partir da fé os homens tomariam decisões importantes em suas vidas e realizariam os julgamentos morais, para a razão era legada a atuação na vida cotidiana, em decisões menores e rotineiras.

Agostinho, por outro lado, conhecedor da filosofia por trás de diversas religiões e muito bem versado em filosofia geral, buscava na razão a justificativa para a fé. Se de um lado entendia que a fé era fundamental, e nunca pretendeu que a razão a subjugasse, de outro entendia que era preciso algo além da própria fé para levar os homens descrentes a considerá-la, utilizando a si mesmo como exemplo, uma vez que nunca foi particularmente inclinado ao cristianismo até encontrar-se com Ambose de Milão e reavaliar-se, convertendo-se em seguida. Entre os muitos tópicos nos quais trabalhou, explorou a questão da liberdade humana, na forma do livre arbítrio, defendendo que a Graça Divina seria o elemento garantidor da liberdade. Formulou ainda a doutrina do pecado original e a teoria da guerra justa.

Como o inovador da filosofia patrística, Agostinho também utilizou-se de argumentos céticos, especialmente em sua refutação à corrente filosófica conhecida como acadêmicos. Em sua De Genesi ad literam, defendeu o conhecimento natural e a razão, ao afirmar que, se passagens da bíblia cristã contradizem a ciência ou a razão, estas passagens devem ser reinterpretadas como metáforas estendidas, não como história. Sua justificação é a de que a razão teria sido dada por Deus que, sendo benevolente, não daria aos homens uma razão enganadora que fosse inclinada a contradizer a bíblia, por mero capricho ou erro.

No que concerne a sua teoria do conhecimento, contrariando Platão, Agostinho defendeu que o testemunho de outras pessoas, mesmo quando não nos traz uma informação verdadeira ou passível de verificação, pode nos trazer novos conhecimentos. De acordo com Gareth Matthews, Agostinho desenvolveu ainda o "argumento a partir da analogia a outras mentes" como solução padrão para o problema das outras mentes, antecipando um debate que seria levado a cabo, com mais enfase, por Descartes, séculos depois.

Segundo Agostinho, os cristão deveriam ser filosoficamente e pessoalmente pacifistas. Isto significa dizer que os cristãos deveriam defender a paz, optando por ela por princípio, sempre que possível, mas permite que, quando não for possível estabelecer a paz, faça-se a guerra. Entendeu que uma postura pacifica perante um mal que apenas poderia ser parado pela violência é um pecado, uma vez que permite a perpetuação deste mal. Nestes casos os cristãos deveriam considerar que uma guerra só é justa se seu objetivo for a manutenção da paz, havendo um comprometimento duradouro com a mesma. Ainda, a guerra não pode ser preventiva, mas apenas defensiva, com o objetivo de restaurar a paz, nunca de atacar aqueles que tem potencial para violar a paz, pois isto seria equivalente a punir antes do crime. Uma vez que nenhum humano é capaz de, com absoluta certeza, garantir que um crime de fato ocorrerá é injusto punir antes que o crime ocorra. Da mesma forma, a guerra só é justa quando defensiva.

Referências bibliográficas:
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Agostinho. Confissões. Trad. J. Oliveira Santos e A. Ambrósio de Pina; “Vida e obra” por José Américo Motta Pessanha. São Paulo: Nova Cultural, 1999. (Coleção Os pensadores).

Agostinho. La inmortalidad del alma. Lope Cilleruelo. Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos, 1988. (Obras completas de San Agustin XXXIX).

Agostinho. A Cidade de Deus Volume II. Trad. de J. Dias Pereira. Lisboa: Fundação Calouste Goulbekian, 2000.

DROBNER, Hubertus. Manual de Patrologia. Petrópolis: Vozes, 2003.

GILSON, Etienne. Introdução ao estudo de Santo Agostinho. Trad. de Cristiane Negreiros Abbud Ayoub. São Paulo: Paulus, 2006.

HIRSCHBERGER, Johannes. História da Filosofia na Idade Média. Trad. Alexandre Correia. São Paulo: Herder, 1966.

OS PENSADORES, “Santo Agostinho” São Paulo: Abril Cultural 1980.

Nash, Ronald H (1969). The Light of the Mind: St Augustine's Theory of Knowledge(Lexington: University Press of Kentucky).

SPINELLI, Miguel. Helenização e recriação de sentidos: a filosofia na época da expansão do cristianismo, séculos II, III, e IV. 2ª Edição Revisada e Ampliada. Caxias do Sul: EDUCS (Editora Universidade de Caxias do Sul), 2015.

Texto originalmente publicado em https://www.infoescola.com/biografias/santo-agostinho/

Por que Santo Agostinho e o filósofo mais importante da Idade Média?

Agostinho foi fortemente influenciado pela teoria dualista de Platão, que fazia uma divisão entre o mundo das ideias e o mundo dos sentidos. Ele transformou a teoria platônica, de forma a adaptá-la à religião: o mundo ideal seria o mundo de Deus (Cidade de Deus), enquanto o mundo das coisas seria o dos seres humanos.

Qual a influência de Agostinho sobre a Idade Média?

Ele aliou o conhecimento à mensagem cristã, tornando-se referência para outros padres e leigos que recorreriam às suas explicações nos sermões e livros escritos por Santo Agostinho para darem continuidade ao trabalho de difusão do cristianismo durante séculos na Idade Média.

Quem foi Santo Agostinho na Idade Média?

Santo Agostinho (354-430) foi um filósofo, escritor, bispo e importante teólogo cristão do norte da África, durante a dominação romana. Suas concepções sobre as relações entre a fé e a razão, entre a Igreja e o Estado, dominaram toda a Idade Média.

Como era conhecido o Santo Agostinho?

Filósofo, bispo, escritor e teólogo, Aurélio Augustino – mais conhecido como Santo Agostinho – foi uma das personalidades mais importantes da Igreja Católica no período da História Medieval.