O que significa dizer ensinar não é transferir conhecimentos Paulo Freire?

Freire introduz Pedagogia da Autonomia explicando suas razões para analisar a prática pedagógica do professor em relação à autonomia de ser e de saber do educando. Ele enfatiza a necessidade de se respeitar o conhecimento que o aluno traz consigo para a escola, visto ser ele um sujeito social e histórico e de se compreender que “formar é muito mais do que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas”. Freire define essa postura como ética e defende a ideia de que o educador deve buscar essa ética, que ele chama de “ética universal do ser humano”, essencial para o trabalho docente.

Como eixo norteador de sua prática pedagógica, Freire defende que “formar” é muito mais que ensinar o desempenho de destrezas, atentando para a necessidade da formação ética dos educadores, conscientizando-os sobre a importância de estimular os educandos a uma reflexão crítica da realidade em que está inserido.

O autor afirma que o professor deverá, também, conduzir a maneira de pensar, pois a prática em si é um testemunho rigoroso de decência e pureza e defende a “disponibilidade ao risco, a aceitação do novo e a utilização de um critério para a recusa do velho”, estando presente a rejeição a qualquer tipo de discriminação. Ele ainda destaca a importância de propiciar condições aos educandos em suas socializações com os outros e com o professor, de testar a experiência de assumir-se como um ser histórico e social que pensa, que critica, que opina, que tem sonhos, que se comunica e que dá sugestões. Freire acredita que a educação é uma forma de transformação da realidade que não é neutra e nem indiferente, mas que tanto pode destruir a ideologia dominante, como mantê-la, e ressalta o quanto um determinado gesto do educador pode repercutir na vida de um aluno (afetividade e postura) e que a reflexão sobre o assunto é necessária, pois, segundo ele, ensinar exige respeito aos saberes do educando. A construção de um conhecimento em parceria com o educando depende da relevância que o educador dá ao contexto social.

A autonomia é uma construção cultural, não é algo natural, depende da relação do homem com os outros e destes com o conhecimento. Então, neste processo, o ato de ensinar, defende Freire, é fundamental. E para ele, “(…) ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou sua construção” (FREIRE, 1998, p. 25). Ensinar pressupõe relação dialógica, na qual docente e discente interagem dialeticamente com perguntas e busca de respostas para a problematização em curso. É um processo de interlocução, no qual indagações se sucedem à procura de inteligibilidade dos fenômenos sociais, culturais ou políticos, e propõe a análise crítica, observando as diversas dimensões da conexão dos fenômenos, através do lançamento de hipóteses e definição de formas de entendimento.

Ao buscar formas de ensinar melhor e de repassar seu conteúdo, o educador pode utilizar de métodos que possibilitem ao discente uma melhor compreensão no que diz respeito ao aprendizado. Ensinar vai além de conteúdos ou de métodos rigorosos, permitindo que o educando utilize o seu cotidiano, não se prendendo somente ao livro didático. É exatamente neste sentido que ensinar não se esgota no tratamento de objeto ou de conteúdo.

Para ensinar é necessário que o educador observe a realidade na qual está inserido, incluindo seus conteúdos programáticos, a fim de se adaptar ao dia a dia. O professor deve ter consciência de que poderá dar a aula que programou, se conseguir adequá-la à vida de seus alunos

A Pedagogia da Autonomia é uma verdadeira lição, não de como um professor deve agir diante de seus alunos, nas um roteiro perfeito que foi escrito para aqueles que, de coração aberto e, claro, grande vocação, se empenham em transformar a educação vigente. É, de fato, um roteiro que, de forma muito simples, ensina o professor a ensinar, pois ensinar não deve ser apenas transferência de conteúdos, mas um ato de respeito ao próximo, à sua bagagem e particularidades.

Lucianna Gontijo – Diretora Educacional da Escola APAE-BH

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

GADOTTI, Moacir. Convite à leitura de Paulo Freire. São Paulo: Ed. Scipione, 1989.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1997.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1994

MACHADO, Rita de Cássia de Fraga. Autonomia. In:. STRECK, Danilo R.; REDIN, Euclides; ZITKOSKI, Jaime José (org.). Dicionário Paulo Freire. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.

VASCONCELOS, Maria Lucia Marcondes Carvalho & BRITO, Regina Helena Pires de. Conceitos de educação em Paulo Freire. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.

O que significa dizer ensinar não é transferir conhecimentos Paulo Freire?

Nesses tempos de “cruzada obscurantista” empreendida pelo Governo Federal, para quem trabalha dentro de uma perspectiva dialógico-democrática, Paulo Freire é o parceiro ideal para enfrentarmos de forma crítica e criativa o atual momento pelo qual passa a educação brasileira.

Aqui no Portal de Educação Tecnológica e Artística (PETECA), o educador e filósofo pernambucano tem lugar garantido, pois ele é um dos eixos da fundamentação teórica do nosso trabalho.

Em 2017, começamos a publicar uma série de trechos selecionados da “Pedagogia da autonomia”, na época, uma forma de lembrar as duas décadas do falecimento do patrono da Educação Brasileira. Na última postagem da série, fechamos o primeiro capítulo (“Não há docência sem discência“) e hoje abrimos o segundo, com o texto “Ensinar não é transferir conhecimento”.

Segundo Freire, este saber necessário à docência, que ensinar não é transferir conhecimento, não só deve ser aprendido por educador(x)s e educand(x)s, mas também precisa ser vivido. Dizendo de outro modo: como educador não posso ficar apenas discursando sobre as razões de ser de uma teoria A ou B, mas meu discurso sobre a teoria A ou B deve ser o exemplo concreto, prático, da teoria, sua encarnação, enfim.

Essa necessidade de vivência, de encarnação da teoria posso exemplificar com minha própria experiência: como professor que há dez anos vem se autoformando, não posso ficar apenas refletindo sobre o novo perfil profissional do professor do século XXI ou discursando sobre os fundamentos epistemológicos e axiológicos de uma comunidade de aprendizagem, antes, preciso agir de forma tal que minhas posturas e iniciativas sejam a manifestação mais imediata do meu discurso sobre as perspectivas teóricas do professor e da escola reflexivas (em julho, mês de aniversário do PETECA, faremos algumas reflexões sobre tais perspectivas).

Como diz Freire:

Não posso apenas falar bonito sobre as razões ontológicas, epistemológicas e políticas da Teoria. O meu discurso sobre a Teoria deve ser o exemplo concreto, prático, da teoria. Sua encarnação.

Antes de passar a palavra para nosso mestre, permitam-me um último comentário sobre algumas características do “pensar certo” mencionadas no mesmo texto. Além de cansativo, o pensar certo é uma postura exigente, difícil, por vezes uma atividade penosa, “que temos de assumir diante dos outros e com os outros, em face do mundo e dos fatos, ante nós mesmos” (Freire, 2001, p. 54).

Mais uma vez, recorro a minha própria experiência para ilustrar as palavras de Freire. Sei bem o quão cansativo e difícil é o “pensar certo”. Assumir uma postura metódica e rigorosa diante do mundo, das pessoas e, principalmente, diante de nós mesmos, realmente, não é tarefa das mais simples.

Estabelecendo 2010 (arbitrariamente, devido a sua importância) como marco da minha trajetória, completo, em 2019, uma década de (auto)formação continuada e transformação identitária (intencionalmente conduzida), onde enfrentei muitos obstáculos, desafios, quedas, medos, fraquezas, incertezas e dúvidas, mas também foi um período de reencantos, de experimentações, de uma maior autoconsciência, de aprendizagens, crescimento, fortalecimento, ganho de autoconfiança e autoestima, que me fazem ter a humildade (para Freire, “condição ‘sine qua’ do pensar certo, que nos faz proclamar o nosso próprio equívoco, que nos faz reconhecer e anunciar a superação que sofremos”) de reconhecer que estou preparado para, em equipe de investigação e reflexão colaborativa, enfrentar os desafios colocados para profissionais da educação e instituições escolares.

Com essa introdução, quis ilustrar que, de fato, “ensinar não é transferir conhecimento”, mas torná-lo concreto, prático, como tenho tentado fazer na última década.

Finalmente, mais abaixo, fiquem com o texto introdutório do segundo capítulo da “Pedagogia da autonomia”. Só para lembrar, a versão abaixo é uma adaptação feita por mim.

Zebé Neto

Professor, pesquisador, escritor e coordenador do PETECA

Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa

Capítulo 2: Ensinar não é transferir conhecimento

Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção. Quando entro em uma sala de aula devo estar sendo um ser aberto a indagações, à curiosidade, às perguntas dos alunos, a suas inibições, um ser crítico e inquiridor, inquieto em face da tarefa que tenho – a ele ensinar e não a de transferir conhecimento.

É preciso insistir: este saber necessário ao professor – que ensinar não é transferir conhecimento – não apenas precisa ser apreendido por ele e pelos educandos nas suas razões de ser – ontológica, política, ética, epistemológica, pedagógica, mas também precisa ser constantemente testemunhado, vivido.

Como professor num curso de formação docente não posso esgotar minha prática discursando sobre a Teoria da não extensão do conhecimento. Não posso apenas falar bonito sobre as razões ontológicas, epistemológicas e políticas da Teoria. O meu discurso sobre a Teoria deve ser o exemplo concreto, prático, da teoria. Sua encarnação. Ao falar da construção do conhecimento, criticando a sua extensão, já devo estar envolvido nela, e nela, a construção, estar envolvendo os alunos.

Fora disso, me emaranho na rede das contradições em que meu testemunho, inautêntico, perde eficácia.

Pensar certo – e saber que ensinar não é transferir conhecimento é fundamentalmente pensar certo – é uma postura exigente, difícil, às vezes penosa, que temos de assumir diante dos outros e com os outros, em face do mundo e dos fatos, ante nós mesmos. É difícil, não porque pensar certo seja forma própria de pensar de santos e de anjos e a que nós arrogantemente aspirássemos. É difícil, entre outras coisas, pela vigilância constante que temos de exercer sobre nós próprios para evitar os simplismos, as facilidades, as incoerências grosseiras.

Pensar certo também é cansativo. É cansativo, por exemplo, viver a humildade, condição “sine qua” do pensar certo, que nos faz proclamar o nosso próprio equívoco, que nos faz reconhecer e anunciar a superação que sofremos.

O clima do pensar certo não tem nada que ver com o das fórmulas preestabelecidas, mas seria a negação do pensar certo se pretendêssemos forjá-lo na atmosfera da licenciosidade ou do espontaneísmo. Sem rigorosidade metódica não há pensar certo.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996, pp. 52-55.

O que significa dizer ensinar não é transferir conhecimentos para Paulo Freire?

ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou sua construção” (FREIRE, 1998, p. 25). Ensinar pressupõe relação dialógica, na qual docente e discente interagem dialeticamente com perguntas e busca de respostas para a problematização em curso.

O que quer dizer aprender é ensinar não é transferir conhecimento?

ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para sua própria produção ou a sua construção" (FREIRE, 2003, p. 47), e que o conhecimento precisa ser vivido e testemunhado pelo agente pedagógico.

O que Paulo Freire quis dizer com quem ensina aprende ao ensinar é quem aprende ensina ao aprender?

Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”, a frase do educador Paulo Freire, uma dos grandes pedagogos brasileiros, é inspiração para professores das mais diversas gerações.

O que é ensinar é aprender para Paulo Freire?

Paulo Freire in Moacir Gadotti, Paulo Freire: Uma Biobibliografia, 1996. Aprender é um ato revolucionário. Por meio da educação, e de maneira coletiva, o indivíduo deve tomar consciência de sua condição histórica, assumir o controle de sua trajetória e conhecer sua capacidade de transformar o mundo.