Dibs em busca de si mesmo online

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Publicado em: 2018-04-05

Dibs em busca de si mesmo online
Sumário
Capa
Rosto
Nota da tradutora
Prólogo
Introdução
Capítulo I
Capítulo II
Capítulo III
Capítulo IV
Capítulo V
Capítulo VI
Capítulo VII
Capítulo VIII
Capítulo IX
Capítulo X
Capítulo XI
Capítulo XII
Capítulo XIII
Capítulo XIV
Capítulo XV
Capítulo XVI
Capítulo XVII
Capítulo XVIII
Capítulo XIX
Capítulo XX
Capítulo XXI
Capítulo XXII
Capítulo XXIII
Capítulo XXIV
Epílogo
Nota da Autora
O Autor e sua Obra
Ficha Técnica
Nota da tradutora
Verdadeiro e generoso como a própria vida, Dibs mostra a aventura conquistada na aventurosa
busca da gratuidade do viver e do encontrar-se.
É um convite para entender e amar a criança que continua escondida em cada um de nós e sentir a
grandiosidade da participação no mistério cósmico que nos une às montanhas, ao mar, às chuvas, às
árvores, aos passarinhos e a todos os animais, às crianças, aos jovens, aos adultos, num
agigantamento de nosso ser e num aproach de nossa originalidade pessoal.
A experiência relatada neste livro é indizível, impossível de submeter-se a uma descrição, mas
as pessoas que se permitiram atingir a estatura do humano sentem e completam os retalhos que aqui
foram escolhidos. A elas, portanto, a alegria de conhecer e amar este Dibs e todos os Dibs do mundo.
Rio de Janeiro, julho de 1973.
Célia Soares Linhares
Prólogo
Esta é a história de uma criança em busca de si mesma, através do processo psicoterápico. Foi
toda ela vivida na sua autenticidade por uma pessoa idêntica a nós — um menino chamado Dibs.
Enquanto essa criança desabrochava no esforço de encontrar as forças da vida, crescia dentro dela
um novo conceito próprio — a inusitada e incessante descoberta de que, dentro dela, existiam uma
estatura e sabedoria que se expandiam e se contraíam “semelhante, às sombras que são influenciadas
pelo sol e pelas nuvens”.
Dibs experimentou profundamente o complexo processo de crescimento na busca do precioso
presente da vida, curando- se a si próprio pelos raios de sol de suas esperanças e pelas chuvas de
suas mágoas.
Vagarosamente, e por tentativas multifacetadas, Dibs descobriu que a segurança de seu mundo
não estava centralizada no contexto circunstancial, mas que o núcleo estabilizador que ele procurava
com tal intensidade tinha profundas raízes dentro de si mesmo.
Porque Dibs expressa uma linguagem que desafia a complacência de muitos de nós, e porque
ansiou e lutou para conquistar sua identidade humana digna de uma missão e lugar neste mundo, sua
história tornou-se a história de cada pessoa à procura de seu autêntico caminho. Através de sua
experiência numa sala de ludoterapia, em seu lar, em sua escola, sua personalidade desenvolveu-se e
enriqueceu de diferentes maneiras a vida daqueles que tiveram o privilégio de conhecê-lo.
Introdução
Esta é a história do desabrochar de uma personalidade forte e saudável, em uma criança
anteriormente marcada por profundos traumatismos.
Quando esta narrativa começa, Dibs vinha frequentando a escola há quase dois anos. Não falava
de modo algum, a princípio. Algumas vezes, sentava-se, mudo e imóvel, durante toda a manhã ou
engatinhava ao redor da sala absorto em si mesmo e desligado das outras crianças e da professora.
Outras vezes, tinha violentos acessos de raiva. Os professores, o psicólogo e o pediatra da
escola estavam dolorosamente confusos com ele. Seria Dibs um retardado mental? Teria seu cérebro
sofrido alguma lesão quando de seu nascimento? Ninguém sabia.
O livro oferece, inicialmente, uma visão daquilo que a autora chama “a busca de si mesmo”, e,
neste caso, pateticamente empreendida por um pequeno ser humano atormentado. No final, Dibs
consegue emergir como uma pessoa brilhante e talentosa, um verdadeiro líder, como resultado da
respeitosa e extraordinária habilidade clínica da Dra. Axline.
A autora já é famosa em todo o mundo da psicologia por suas contribuições para a teoria e
prática da ludoterapia infantil. Seu livro Play therapy: the inner dynamics of childrens! tem
merecidamente conquistado o mais amplo aplauso aceitação.
Dibs: em busca de si mesmo é um livro agradável e fascinante para qualquer leitor. Será lido
com prazer e especial proveito por todos os pais que estão interessados nas maravilhas do
desenvolvimento mental de seus filhos. Também os estudiosos da infância e da natureza normal e
anormal da vida mental nele encontrarão vívidos ensinamentos.
A criança descrita neste livro era, a princípio, muito excêntrica. Entretanto, psicólogos e
psiquiatras têm, desde há muito, reconhecido que aspectos novos dos processos típicos normais do
desenvolvimento da saúde mental podem ser obtidos pelo estudo de diferentes e exageradas formas
de comportamento que aparecem em indivíduos atípicos. Pode ser observado que, historicamente, a
moderna psicologia muito deve às análises detalhadas de casos singulares. Neles podem ser
incluídos os primeiros trabalhos de Freud e Morton Prinde.
Não há dúvida de que um dos grandes problemas desta era tecnológica, caracterizada por
grandes aglomerados urbanos, é a compreensão autêntica das técnicas que possibilitam mudanças
duráveis na personalidade e no comportamento. Dibs: em busca de si mesmo, como estudo da
organização mental e da modificação de atitudes, é importante nesse contexto. As pessoas que vierem
a ler e compreender este livro jamais poderão acreditar novamente que o crescimento psicológico do
homem, o sucesso na escola, ou a aquisição de complexas habilidades possam ser conquistadas pela
mera repetição generalizada ou pelo reforço de simples modelos de reação.
Outra ideia enfatizada neste livro é a de que o tratamento verdadeiramente profundo e efetivo de
uma criança com distúrbios tende a ajudar, de maneira real, a saúde mental de seus pais. É o reverso
da informação tão difundida de que o tratamento clínico bem-sucedido dos pais representa,
frequentemente, a melhor forma de terapia para uma criança com problemas emocionais. Mas acima
de tudo, Dibs: em busca de si mesmo é uma leitura deliciosa! Tão empolgante para mim como as
histórias de detetive de primeira categoria.
Leonard Carmichael
Washington, D.C.
Capítulo I
Era hora do almoço, hora de ir para casa, e as crianças circulavam com seu barulho habitual,
ziguezagueando para apanhar seus casacos e chapéus. Todas, menos Dibs. Ele recuara até o canto da
sala, e lá permanecia agachado, cabeça baixa, braços dobrados e firmemente cruzados sobre o peito,
ignorando o mundo à sua volta. Os professores aguardavam. Esse era seu comportamento habitual na
hora de ir para casa.
Miss Jane e Hedda ajudavam as outras crianças quando se fazia necessário e, disfarçadamente,
observavam Dibs.
Uma a uma, as outras crianças iam deixando a escola, à medida que suas mães as chamavam.
Quando as professoras ficavam a sós com Dibs, trocavam rápidos olhares entre si e o olhavam
premido contra a parede.
— Sua vez! — Miss Jane dizia, e caminhava calmamente para fora da sala.
— Vamos, Dibs. Está na hora de voltar para casa. Está na hora do almoço — Hedda falava com
paciência.
Dibs não fazia nenhum movimento. Sua resistência era total e cheia de tensão.
— Vou ajudá-lo a vestir o casaco — Hedda dizia aproximando-se dele vagarosamente, levando-
lhe o agasalho.
Ele nem sequer olhava para cima. Comprimia-se contra a parede e cobria a cabeça com os
braços.
— Por favor, Dibs. Sua mãe logo estará aqui.
Ela chegava sempre atrasada, provavelmente esperando que a batalha do chapéu e do casaco já
tivesse terminado e que, então, Dibs pudesse segui-la pacificamente.
Hedda aproximava-se mais de Dibs e, inclinando-se, batia com carinho em seu ombro.
— Vamos, Dibs, você sabe que é hora de ir — repetia gentilmente.
Como um monstrinho ele a agredia: esbofeteando-a, arranhando-a, tentando mordê-la, gritando
estridentemente.
— Não VOU para casa. Não VOU para casa. Não VOU para casa. — Era o mesmo clamor todos
os dias.
— EU Sei — Hedda insistia. — Mas você tem que ir para casa almoçar. Você quer ser grande e
forte, não é Verdade?
Dibs ficava passivo de repente. Abandonava a atitude de luta contra Hedda. Deixava que ela
colocasse seus braços dentro das mangas do casaco e o abotoasse.
— Você voltará amanhã — dizia-lhe Hedda.
Quando sua mãe o chamava, Dibs seguia com ela, com o rosto manchado de lágrimas e uma
expressão de vazio nele estampada.
Quando a batalha era mais longa e a mãe chegava antes que estivesse terminada, o motorista era
enviado para apanhá-lo. Era um homem multo alto e forte. Entrava, tomava Dibs nos braços e
carregava-o para o carro, sem dirigir uma palavra a ninguém. Em determinadas ocasiões, Dibs
esmurrava-o e gritava dominado pela fúria. Em outras, tornava-se subitamente silencioso, inerte,
derrotado. O homem nunca falava com o garoto. Parecia ser-lhe indiferente se ele lutava e vociferava
ou se permanecia submisso.
Havia quase dois anos que Dibs frequentava essa escola particular. Os professores haviam
tentado por todos os meios estabelecer relações com ele, suscitar-lhe uma resposta. Mas haviam sido
tentativas repetidas e frustradas. Ele parecia decidido a manter-se isolado das pessoas. Pelo menos
era o que Hedda pensava. Seu progresso na escola era evidente. Quando começou a frequentá-la não
falava nada e jamais se arriscava a sair de sua cadeira. Durante toda a manhã permanecia sentado,
mudo, insensível. Decorridas várias semanas, principiou a levantar-se e engatinhar ao redor da sala,
parecendo perceber algumas coisas à sua volta. Quando alguém se aproximava, Dibs precipitava-se
como uma bola no chão e não mais se movia. Nunca olhava diretamente para os olhos de uma pessoa.
Jamais respondia quando alguém lhe falava.
Sua assiduidade era perfeita. Todos os dias sua mãe o trazia para a escola de carro. Ou ela
mesma o conduzia, austero e silencioso, ou o motorista carregava-o, colocando-o junto à porta dentro
da escola.
O menino jamais gritava ou chorava no caminho para o colégio. Deixado bem na entrada, Dibs
ali permanecia choramingando e esperando até que alguém viesse e o levasse para a sala de aula.
Quando usava agasalho não esboçava nenhum movimento para tirá-lo. Uma das professoras
cumprimentava-o, tirava-lhe o casaco e deixava-o pronto para fazer o que desejasse. Logo as outras
crianças ocupavam-se diligentemente com atividades em grupos ou com trabalhos individuais. Dibs
passava o tempo engatinhando ao redor da sala, escondendo-se sob as mesas ou atrás do piano,
olhando livros durante horas.
Havia alguma coisa em relação ao comportamento de Dibs que impedia os professores de
classificá-lo, segura e rotineiramente, e deixá-lo seguir seu caminho. Suas atitudes eram tão
paradoxais. Às vezes, apresentava indícios de retardamento mental em grau extremo. Outras vezes
realizava certas atividades com tanta rapidez e tranquilidade, que evidenciava possuir, de fato, um
nível de inteligência superior. Se desconfiava que o estavam olhando, imediatamente recolhia-se à
sua concha. Durante a maior parte do tempo, engatinhava em volta da sala espreitando por baixo da
mesa, balançando-se para a frente e para trás, mastigando um lado da mão, chupando o polegar e
deitando-se de bruços, rígido, no chão, quando qualquer professora ou colega tentava fazê-lo
participar de alguma atividade.
Era ele uma criança solitária, num mundo que certamente lhe parecia frio e hostil.
Não raras vezes, era acometido por acessos de raiva, na hora de ir para casa, ou quando tentavam
obrigá-lo a fazer algo que ele não queria. Os professores tinham decidido, havia bastante tempo, que
sempre o convidariam para participar do grupo, mas jamais tentariam impor-lhe qualquer atividade,
a não ser que fosse absolutamente necessário.
Ofereciam-lhe livros, brinquedos, quebra-cabeças; enfim, todo tipo de material que lhe pudesse
interessar. Dibs nunca recebia nada diretamente de alguém. Se o objeto fosse colocado na mesa ou no
chão perto dele apanhava-o depois de certo tempo e o examinava cuidadosamente. Nunca deixava de
aceitar um livro. Olhava atentamente as páginas escritas “como se pudesse ler”, como Hedda
frequentemente dizia.
Em muitas ocasiões, uma professora sentava-se perto dele e lia uma estória ou falava-lhe sobre
alguma coisa, enquanto Dibs deitava a cabeça no chão, sem se mover, mas jamais olhava para cima
ou demonstrava um interesse evidente. Miss Jane ocupava-se dele da seguinte maneira: explicava-lhe
muitas coisas, enquanto segurava os objetos na mão, demonstrando o que expunha. Às vezes, o
assunto era ímãs e o princípio da ação magnética; outras, uma pedra interessante. Ela conversava
sobre qualquer assunto que julgasse capaz de despertar-lhe o interesse; confessava em várias
oportunidades que se sentia como uma tola, como se estivesse falando sozinha; entretanto, pequenos
detalhes, como a atitude atenta do menino, davam-lhe a nítida impressão de que ele estava ouvindo.
Além disso, perguntava-se frequentemente o que ela teria a perder.
Os professores estavam inteiramente frustrados em relação a Dibs. A psicóloga da escola o havia
observado e tentado testá-lo várias vezes, mas ele não estava pronto para ser testado. O pediatra da
escola, depois de examiná-lo diversas vezes, desistiu, desanimado. Dibs predispôs-se contra o
médico de jaleco branco e não o deixava aproximar-se. Recuava até ficar com as costas contra a
parede e colocava as mãos para cima “prontas para arranhar”, prontas para lutar se alguém tentasse
aproximar-se.
— Ele é um tipo estranho — disse o pediatra. — Quem pode saber? Retardado mental?
Psicótico? Lesão cerebral? Quem pode se aproximar o suficiente para descobrir as causas de sua
estranha conduta?
Aquela não era uma escola para retardados mentais ou crianças com problemas emocionais. Na
realidade, era uma escola particular, destinada exclusivamente a crianças de três a sete anos de
idade, instalada numa antiga e bela mansão, na parte mais luxuosa do lado leste de Nova York. Tinha
uma tradição que atraía os pais de crianças especialmente inteligentes e sociáveis.
Para matriculá-lo, a mãe de Dibs persuadiu a diretora e usou sua influência através do conselho
de diretores. Sua tia contribuía generosamente para a manutenção da escola. Em razão dessas
pressões, Dibs foi admitido no grupo de nível maternal.
Os professores haviam sugerido repetidas vezes que Dibs necessitava de ajuda profissional. A
resposta da mãe era sempre a mesma:
— Deem-lhe mais tempo!
Quase dois anos haviam decorrido e, embora Dibs tivesse apresentado algum progresso, os
professores sentiam que aquilo não era suficiente. Parecia-lhes injusto deixar a situação prolongar-se
por mais tempo. Podiam apenas esperar que ele saísse de sua concha. Quando discutiam sobre o
garoto — e não havia dia em que não o fizessem — , terminavam sempre sentindo-se perplexos e
desafiados pela criança.
Afinal de contas, Dibs tinha somente cinco anos de idade. Poderia ele, na verdade, estar
consciente do mundo que o circundava e manter tudo trancado dentro de si? Parecia ler os livros que
examinava. Isso, diziam de si para si, era ridículo. Como poderia uma criança ler se não sabia
expressar-se verbalmente?
Poderia tal criança, tão complexa, ser considerada retardada mental? Seu comportamento não
confirmava tal hipótese. Seria ele um autista? Estaria em contato com a realidade?
Muito frequentemente parecia que seu mundo era uma atroz realidade, um tormento de
infelicidades.
O pai de Dibs era um renomado cientista — brilhante, todos diziam — mas ninguém na escola
jamais o vira.
Dibs tinha uma irmã mais nova.
Sua mãe dizia que Dorothy era “muito inteligente” e uma “criança perfeita”. Ela não frequentava
a mesma escola. Certa vez, Hedda encontrou-a em companhia da mãe no Central Park. Dibs não
estava com elas. Hedda declarou aos professores que, em sua opinião, a “perfeita Dorothy” não
passava de uma “pirralha mimada”. Estava simpaticamente interessada em Dibs e admitia ser
tendenciosa sua avaliação sobre Dorothy. Sua fé em Dibs levava-a a crer que algum dia, de alguma
maneira, ele se libertaria de sua prisão de medo e ódio.
A equipe de professores decidiu, finalmente, tomar uma atitude em relação a Dibs. Alguns pais já
começavam a reclamar de sua presença na escola — sobretudo depois que ele arranhou uma criança.
Foi nessa altura dos acontecimentos que me convidaram para participar de uma reunião dedicada
aos problemas de Dibs. Como psicóloga clínica, tenho-me especializado no trabalho com crianças e
seus pais. A primeira vez que ouvi falar sobre Dibs foi nessa reunião, e o que aqui escrevi me foi
relatado pelos professores, psicólogo e pediatra da escola. Pediram-me que observasse o garoto e a
mãe, e então emitisse uma opinião para a equipe docente e administrativa do colégio, antes que
decidissem dispensá-lo e registrá-lo como um de seus fracassos.
O encontro foi na escola. Ouvi com interesse todas as observações. Fiquei impressionada com o
impacto que a personalidade de Dibs havia causado naquelas pessoas. Sentiam-se frustradas e
desafiadas continuamente pelo seu comportamento estranho. Sua firmeza limitava-se a uma
antagônica e hostil rejeição às pessoas que poderiam aproximar-se muito dele. Sua evidente
infelicidade preocupava aquelas pessoas sensíveis, que sentiam sua triste depressão.
— Tive um encontro com sua mãe na semana passada — disse-me Miss Jane. — Comuniquei-lhe
que, muito provavelmente, deveremos desligá-lo da escola, porque sentimos ter feito o que podíamos
para ajudá-lo, mas mesmo nosso máximo esforço não basta.
Ela ficou muito frustrada. Mas ela é uma pessoa muito difícil de descrever. Concordou em
deixar-nos chamar uma psicóloga clínica e tentar, mais uma vez, avaliá-lo. Falei-lhe sobre você.
Aquiesceu em ter uma conversa com você sobre Dibs, e deixar que o observe aqui. Depois pediu
que, se não pudéssemos mantê-lo conosco, lhe sugeríssemos uma escola com internato para crianças
excepcionais. Disse que ela e o marido já aceitaram o fato de que Dibs é um retardado mental ou
provavelmente tem alguma lesão cerebral.
Tal observação suscitou uma explosão em Hedda:
— Ela prefere acreditar que ele é um retardado mental, a admitir que talvez ele seja
emocionalmente perturbado e que talvez seja ela a responsável — exclamou.
— Parece que não somos capazes de ser bastante objetivos em relação a Dibs. Penso que
ficamos com ele por tanto tempo e fizemos muito pelo pouco progresso que ele conseguiu. Não
poderíamos expulsá-lo, pois lá fora não haveria mãos que o defendessem. Não temos sido capazes de
discutir sobre Dibs sem ficarmos envolvidos em nossas próprias reações emocionais relacionadas a
ele e às atitudes de seus pais. E não estamos mesmo certos de que nosso julgamento sobre seus pais
seja justificado.
— Estou convencida de que ele está prestes a desabrochar — Hedda prognosticou. — Não
acredito que possa segurar suas defesas por mais tempo.
Havia, obviamente, alguma coisa nessa criança que cativava os interesses e sentimentos de todos.
Pude sentir a compaixão daqueles que trabalhavam na escola por esse garoto. Pude sentir o impacto
de sua personalidade. Pude sentir e compreender a consciência opressiva de nossas limitações para
entendermos, em termos claros e precisos, os intrincados mistérios de uma personalidade. Pude
admirar o respeito por esse menino, que transparecia na reunião.
Estava decidida que veria Dibs em uma série de sessões de ludoterapia — se seus pais
concordassem.
Não tínhamos nenhuma maneira de saber o que poderia ser ainda acrescentado à história de Dibs.
Capítulo II
Encontrava-me diante do desconhecido, onde uma luz baixa escondia as linhas da realidade e
arremessava uma nuvem de incertezas sobre o amanhã. Nada se podia afirmar, nem negar. Sem os
lampejos da evidência inequívoca, defrontava-me com o mistério daquele ser, numa atitude de
respeito e de humildade. Sabia que as trevas da ignorância proporcionam um espaço crescente para
julgamentos incoerentes e acusações tendenciosas, expressas ao sabor das emoções. Nessa
atmosfera, qualquer conclusão definitiva traz em seu bojo a ambiguidade. É aí que os benefícios da
dúvida podem obrigar-nos a refletir melhor sobre os objetivos e limit...

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