O que causa algum tipo de alteração nas vegetações naturais do Brasil?

Cerca de um terço de todo o desmatamento da vegetação nativa do Brasil ocorrido desde a chegada dos portugueses, em 1500, se deu somente nos últimos 37 anos, revelou um levantamento da ONG MapBiomas divulgado nesta sexta-feira (26/08).

O levantamento mostra que 13,1% da vegetação nativa do país, entre florestas, savanas e outras formações não florestais, foi devastada entre 1985 e 2021. Nesse período, a porção do território brasileiro coberta por vegetação nativa caiu de 76% para 66%.

As áreas devastadas desde 1985 deram lugar à agropecuária, que atualmente responde por um terço do uso da terra no Brasil. Em 37 anos, a área ocupada pela agropecuária passou de 21% para 31%. O maior crescimento foi nas áreas utilizadas pela agricultura, 228%, que agora correspondem a 7,4% do território nacional.

“Apesar de 72% da área de expansão da agricultura ter ocorrido sobre terras já antropizadas [cujas características originais foram alteradas pela ação humana], principalmente pastagens, é importante ressaltar que 28% da mudança para lavoura temporária se deu sobre desmatamento e conversão direta de vegetação nativa”, afirmou Laerte Ferreira, professor da Universidade Federal de Goiás e coordenador da Equipe de Mapeamento de Pastagem e do Grupo de Trabalho Solos do MapBiomas.

Segurança hídrica e alimentar em jogo

Os dados, lançados numa coleção de sete mapas anuais de cobertura e uso da terra no Brasil, ressaltam que a alteração no uso do solo agravou os desafios de preservação da segurança hídrica, alimentar e energética no país.

As mudanças do uso da terra desencadearam uma redução da superfície de água que, nos últimos 30 anos (1991 a 2021), registaram perda de 17,1%. O fenômeno atingiu especialmente o Pantanal, um bioma fortemente influenciado, por exemplo, pela variação da umidade gerada na evapotranspiração das árvores da Amazônia.

“A ocupação do solo e a produção rural precisam ser compatibilizadas com a conservação dos biomas”, afirmou Tasso Azevedo, coordenador do MapBiomas, apontando que a tendência de rápidas transformações é um grande desafio para o desenvolvimento e ocupação territorial sustentáveis e prósperas.

O levantamento mostra ainda que o processo de conversão de vegetação nativa em lavoura e pastagens foi mais intenso em algumas regiões, principalmente no Matopiba – área com predominância de Cerrado entre os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – e na Amacro, na Amazônia Legal, entre os estados do Acre, Amazonas e Rondônia, e no Pampa, no Rio Grande do Sul.

O Matopiba concentrou 56,2% da perda de vegetação nativa no Cerrado nos últimos 20 anos. Na Amacro, a perda de florestas aumentou fortemente na última década, representando 22% do desmatamento na Amazônia contra 11% no período de 2000-2010. O Pampa, por sua vez, é o bioma de maior transformação proporcional tendo sua área de vegetação nativa reduzida de 61,3% para 46,3% em 37 anos.

“Mesmo tendo como vegetação predominante os campos nativos que são plenamente compatíveis com a atividade pecuária, o Pampa vem sendo convertido para o cultivo agrícola, especialmente de soja e os plantios de eucalipto e pinus”, destaca o levantamento.

Importância de terras indígenas

O MapBiomas destacou ainda a importância das terras indígenas para a preservação da Amazônia, mostrando que a perda de vegetação nativa em territórios indígenas foi de apenas 0,8% entre 1985 e 2021, contra a perda de 21,5% registada fora de áreas protegidas nesse bioma.

A organização alertou ainda que apesar de 66% do território do Brasil ser coberto por vegetação nativa, isso não significa que essas áreas sejam na totalidade conservadas, já que a análise da evolução das mudanças de uso da terra ao longo dos anos apontou que pelo menos 8,2% de toda vegetação nativa existente é secundária, ou seja, são áreas que já foram desmatadas pelo menos uma vez nos últimos 37 anos ou já estavam desmatadas em 1985.

Para o levantamento, o MapBiomas analisou dados de satélites. “Os satélites nos ajudam a revelar os desafios de como expandir a agropecuária sem desmatamento, como proteger os recursos hídricos e como ocupações urbanas podem ser mais seguras e menos desiguais”, afirma Julia Shimbo, Coordenadora Científica do MapBiomas e pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).

  • Segundo novo levantamento do MapBiomas, 87,2 milhões de hectares de áreas de vegetação nativa foram destruídos de 1985 a 2019.

  • Mais da metade dessa destruição aconteceu na Amazônia.O Cerrado, no entanto, é o bioma proporcionalmente mais afetado.

  • Agropecuária é responsável por mais de 90% de toda a degradação.

  • Governo Bolsonaro, no entanto, prefere ignorar a ciência, aporta recursos em satélites desnecessários e esvazia fiscalização; especialistas criticam.

O Brasil perdeu 87,2 milhões de hectares de áreas de vegetação nativa de 1985 a 2019, o equivalente a 10% do território nacional. Essa área é maior que o tamanho de países como Alemanha, Inglaterra, Itália e Portugal somados. Ou 3,5 vezes a área do estado de São Paulo.

Mais da metade dessa vegetação, 44 milhões de hectares, foi destruída na Amazônia. Já o Cerrado perdeu 28,5 milhões de hectares. Proporcionalmente, porém, o Cerrado foi o bioma que mais viu a sua área desaparecer, superando 21% do total da savana. E o Pantanal, que enfrenta em 2020 uma situação de queimadas crítica, perdeu 12% de sua área nas últimas décadas.

Os dados são do recém-divulgado levantamento do MapBiomas, projeto que mapeia ano a ano o uso do solo no Brasil.

No geral, mais de 90% de toda a perda de vegetação natural no Brasil, incluindo todos os biomas, foi em função da agropecuária, que se expandiu em 78 milhões de hectares, com 43% de crescimento desde 1985.

A acurácia do levantamento atual do MapBiomas é de 91%, explica Tasso Azevedo, coordenador da plataforma, que envolve uma rede de especialistas de diversas formações, ONGs, universidades e empresas de tecnologia.

Além dos dados históricos consolidados desde 1985, revelados pela primeira vez, a última versão do MapBiomas também traz dados de desmatamento e regeneração, como a velocidade de perda de vegetação nativa por bioma e os territórios onde há mais vegetação secundária —áreas anteriormente degradadas que hoje cobrem 9% do país. Em algumas regiões, as florestas secundárias já superam as primárias.

“O MapBiomas é um produto vivo”, diz Tasso Azevedo. A cada ano, segundo ele, novas camadas de informação são adicionadas e as versões anteriores são atualizadas de acordo com informações de satélite e de pesquisa mais precisas.

A chamada Coleção 5 da plataforma também incluiu o monitoramento de áreas de lavouras como soja e cana, além de melhorias nos mapeamentos de pastagem e agricultura no Brasil.

Agora é possível entender como a expansão da soja, commodity da qual o Brasil é o maior produtor mundial e uma das principais responsáveis pelo desmatamento, aconteceu ano a ano entre 2000 e 2019. Em 2020, a safra de soja atingiu o recorde de 247,4 milhões de toneladas. Por trás desses números está sobretudo a destruição do Cerrado, bioma mais afetado pela expansão da leguminosa.

Já culturas consideradas perenes, como o café, aparecem pela primeira vez no MapBiomas. Os dados devem ser aprimorados nos próximos anos.

O que causa algum tipo de alteração nas vegetações naturais do Brasil?
Fonte: MapBiomas

Uma boa notícia revelada por essa rodada de informações da plataforma é que a área de pastagens com sinal de degradação caiu de 72% em 2010 para 60% em 2018. Um número ainda altíssimo, mas que revela uma queda acentuada em pouco tempo.

A explicação para isso, segundo Azevedo, é que como o desmatamento teve uma tendência de queda na última década. Além das políticas para o clima que foram implementadas, parte dos pecuaristas foram obrigados a melhorar a produtividade, um problema crônico do setor.

A tendência do desmatamento, no entanto, está sendo fortemente revertida nos anos de governo Bolsonaro. A destruição da Floresta Amazônica aumentou 34% entre agosto de 2019 e julho de 2020 em comparação com o mesmo período do ano anterior. Mesmo áreas protegidas por lei, como unidades de conservação e terras indígenas, viram uma alta de 40% na devastação no mesmo período.

Enquanto anuncia o fim de ações de combate ao desmatamento por “falta de verba” e volta atrás em seguida, o Governo Federal ignora o trabalho minucioso de plataformas como o MapBiomas, além dos levantamentos do próprio Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), e anuncia que irá gastar R$ 145 milhões em um novo satélite de monitoramento.

Para Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, o governo Bolsonaro faz uma campanha aberta contra o Inpe porque “esse é um governo que não gosta da verdade”. O objetivo seria colocar no lugar do Inpe “algum mecanismo que publique apenas o que o governo acha que é bom para ele”. É por isso que Bolsonaro “ignora esses órgãos que fazem pesquisa e ciência”, critica Astrini.

Tasso Azevedo concorda que, se o objetivo do satélite adquirido pelo governo for ajudar a combater o desmatamento, esse é um investimento que não resolverá nada, já que os sistemas de monitoramento disponíveis hoje para a Amazônia são extremamente efetivos e confiáveis, tidos como referências mundiais.

“Não existe nenhuma floresta no mundo hoje, não só tropical, mais monitorada do que a Amazônia. A informação que temos é muito mais do que suficiente. O que falta é ação. Esse recurso poderia ser usado para ações de fiscalização e de controle remoto, que foram paralisadas. Essas duas coisas juntas dariam resultados rápidos e objetivos”, avalia Azevedo.

Imagem do banner: Desmatamento no município de Tapurah, Mato Grosso. Foto: Mayke Toscano/Gcom-MT

Matéria publicada por Xavier Bartaburu

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O que causa algum tipo de alteração nas vegetações naturais do Brasil?

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O que causa alterações na vegetação natural?

Atualmente todas as formações vegetais, em maior ou menor grau, encontram-se modificadas pela ação humana. Isso ocorreu principalmente por causa das atividades agropecuárias e pelos impactos causados pela industrialização e urbanização.

Qual o principal motivo para a destruição das vegetações do Brasil?

O desmatamento no Brasil ocorre principalmente para a prática da atividade agropecuária. Porém, a construção de estradas, hidrelétricas, mineração e o processo intensivo de urbanização contribuem significativamente na redução das matas.

Como iniciou o processo de alteração da vegetação do Brasil?

O desmatamento no Brasil foi iniciado a partir do processo de colonização implementado pelos portugueses. Desde então, boa parte da vegetação do país foi devastada. O Brasil conta com seis tipos diferentes de florestas: a Mata Atlântica, a Caatinga, o Cerrado, a Mata de Araucária, o Pantanal e a Floresta Amazônia.

O que mudou na vegetação brasileira?

A redução de sua área nativa se deu, sobretudo, pelo avanço das atividades agrícolas, que tem “expansão contínua e acelerada”. O IBGE destacou que, ao longo do tempo, observou-se a substituição de pastagens por monocultura de grãos e cereais nas chapadas e planaltos, relevo característico do bioma.